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Homem condenado pela prática do crime de falsificação de documento de especial valor por sonegar a existência de outros herdeiros no pedido da escritura


Depois do falecimento do pai, A deslocou-se ao cartório notarial para tratar a “escritura de habilitação de herdeiros”. Mesmo sabendo bem que o pai tinha outros filhos e ele tinha outros irmãos, A declarou perante o notário que ele era o único titular do direito de preferência de herança ou ninguém tinha o direito de partilhar com ele a herança, o que fez com que o cartório notarial inscrevesse na “escritura de habilitação de herdeiros” que ele era o único herdeiro legal do seu pai. Utilizando a escritura referida, A transferiu para si próprio o imóvel registado em nome do seu pai e, posteriormente, vendeu-o pelo preço de MOP2.840.040,00.

O Ministério Público acusou A da prática do crime de falsificação de documento de especial valor. Proferiu a decisão o Tribunal Colectivo do Tribunal Judicial de Base em 13 de Junho de 2017, condenando A pela prática, em autoria material e na forma dolosa e consumada, de um crime de falsificação de documento de especial valor, p.p. pelo artigo 245º, conjugado com o artigo 244º, nº 1, al. b), ambos do Código Penal, na pena de 1 ano e 3 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 anos, sob condição de pagar à RAEM uma contribuição da quantia de MOP5.000,00, no prazo de um mês, após o trânsito em julgado do acórdão.

Inconformado, A recorreu para o Tribunal de Segunda Instância, invocando que ao condená-lo pela prática do crime de falsificação de documento de especial valor, o Tribunal “a quo” incorreu em erro na aplicação do direito e alegando que devia ser condenado pela prática do crime de falsas declarações, p.p. pelo artigo 97º, nº 2 do Código do Notariado. Como motivo complementar, A invocou que as provas produzidas pelo Tribunal “a quo” não eram suficientes para comprovar o elemento subjectivo e objectivo na prática de falsificação de documento pelo A, nem podiam comprovar o elemento subjectivo mesmo que fosse comprovado o elemento objectivo, o que mostrou o erro notório na apreciação da prova.

Tendo apreciado o processo, o juiz relator do Tribunal de Segunda Instância indicou o seguinte na decisão sumária proferida em 19 de Dezembro de 2017:

Questão de apreciação da prova: os factos provados no acórdão recorrido especificaram que A fez deliberadamente o notário inscrever na “escritura de habilitação de herdeiros” o facto falso de que ele era o único titular do direito de preferência de herança ou ninguém tinha o direito de partilhar com ele a herança. O Tribunal “a quo” reconheceu tal facto com base na confissão do recorrente A, mas isso não implicou renúncia à produção da prova relativa aos factos imputados prevista no artigo 325º, nº 2 do Código de Processo Penal, o que quer dizer que, aparentemente, o reconhecimento dos factos provados por parte do Tribunal “a quo” não se baseou simplesmente na confissão do A. Por outro lado, objectivamente, o acto do A já prejudicou a fé pública da escritura, afectando a autenticidade e exactidão dos dados constantes deste tipo de documentos. A intenção subjectiva e o acto objectivo do A preencheram os elementos constitutivos, quer o subjectivo quer o objectivo, do crime de falsificação de documento de especial valor.

Questão de erro na aplicação do direito: a “escritura de habilitação de herdeiros” é um documento com força especial e importante, que é utilizado para proceder a procedimento de sucessão, sendo um fundamento essencial no acto de transferência dos bens do autor da herança. Ele é um instrumento público contendo factos com relevância jurídica que é um dos documentos protegidos pelos artigos 244º e 245º do Código Penal. E o delito previsto no nº 2 do artigo 97º do Código do Notariado é mesmo o crime de falsificação de documento de especial valor p.p. pelos artigos 244º e 245º do Código Penal. Pelo exposto, o Tribunal “a quo” não incorreu em erro na aplicação do direito.

Deste modo, o juiz relator julgou improcedente o recurso do A e rejeitou-o.

Ainda inconformado, A reclamou para o Tribunal Colectivo.

Apreciada a reclamação, o Tribunal Colectivo do Tribunal de Segunda Instância proferiu decisão em 1 de Março de 2018, salientando que o recorrente A prestou declaração falsa de ser o único herdeiro perante um notário (oficial público). A não só prestou declaração falsa, o pior é que o seu acto fez com que o oficial público inscrevesse um facto falso declarado por ele na “escritura de habilitação de herdeiros” que é um documento com força especial e importante. O seu acto preenche completamente o elemento objectivo do crime de falsificação de documento de especial valor p.p. pelos artigos 244º e 245º do Código Penal.

Nos termos expostos, o Tribunal Colectivo rejeitou a reclamação do recorrente A, mantendo a decisão proferida pelo Tribunal Judicial de Base.

Cfr. o acórdão proferido no processo nº 802/2017 do Tribunal de Segunda Instância.

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

20/09/2018



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