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TUI: na ausência de prova por escrito, é inadmissível a prova testemunhal de transacção simulada


A, B e C são amigos próximos. Em 2001, A adquiriu a fracção X. No ano 2010, B precisou de dinheiro com urgência para liquidar a sua dívida. Por ter contraído empréstimo junto do Banco G em 2018, constituindo uma hipoteca sobre a fracção X a favor deste, foi impossível a A pedir um novo empréstimo através de segunda hipoteca para ajudar B a pagar a dívida, assim sendo, C propôs-lhes que A alienasse a B a fracção X através da compra e venda simulada, de forma a que B pedisse empréstimo ao banco com a fracção para liquidar a dívida contraída junto de terceiro, A aceitou tal proposta. Em 9 de Março de 2010, A e B lavraram uma escritura pública de compra e venda, nos termos da qual A vendeu a fracção a B pelo preço de MOP1.300.000,00 e B comprou a fracção. No mesmo dia, B assinou uma escritura pública de hipoteca, nos termos da qual constituiu uma hipoteca sobre a fracção a favor do Banco F da garantia do empréstimo concedido por esse banco a B no valor de MOP2.070.292,36, o Banco F emitiu a A uma livrança bancária no valor de HKD1.980.000,00. Em 11 de Março de 2010, A pagou todo o empréstimo que o Banco G lhe concedera no valor de HKD759.585,22. No mesmo dia, A também levantou numerário no valor de HKD880.000,00, do qual entregou a quantia de HKD600.000,00 a B para que este liquidasse directamente a dívida para com o terceiro. O empréstimo contraído por A foi liquidado com o empréstimo contraído por B junto do Banco F, porém, como a compra e venda entre eles não era real, A pagou dinheiro a B bimestralmente para o ajudar a pagar as amortizações do Banco F, é tal como A liquidava mensalmente o empréstimo ao Banco G. Em 30 de Agosto de 2011, por escritura pública, B vendeu a fracção X a C pelo preço de HKD2.100.000,00. Em 2 de Maio de 2014, C assinou uma escritura pública de hipoteca, nos termos da qual constituiu uma hipoteca sobre a fracção X a favor do Banco E para garantir um empréstimo de HKD3.870.000,00. Em 29 de Agosto de 2018, por escritura pública, C vendeu a fracção X a D pelo preço de HKD7.800.000,00. No mesmo dia, D constituiu uma hipoteca sobre a fracção X a favor de E para garantir o empréstimo concedido por E a D no valor de HKD3.880.000,00. Pelo menos em Maio de 2019, A soube que C transferira a fracção a D. A intentou perante o TJB uma acção declarativa sob a forma de processo ordinário contra B, C, D e E, pedindo que fossem declaradas nulas as compras e vendas entre A e B, B e C, C e D, em relação à fracção X. Conhecendo do caso, o TJB proferiu sentença a qual, por procedência parcial da acção por A proposta, declarou a nulidade das compras e vendas da fracção em questão, ordenando o cancelamento das correspondentes inscrições. Do assim decidido, D recorreu para o TSI, que, realizado o julgamento, decidiu conceder provimento parcial ao recurso interposto da decisão da matéria de facto e, em consequência, revogou a decisão recorrida no concernente a B, C e D, absolvendo-os dos pedidos, mantendo-se o decidido quanto a E relativamente ao qual não foi interposto recurso. Por conseguinte, desse acórdão recorreu A para o TUI.

O Colectivo do TUI conheceu do caso.

Antes de mais, o Colectivo indicou que, deu o TJB como provada a simulação na compra e venda da fracção X entre A e B, declarando assim a sua nulidade, com a consequente invalidade dos negócios que sobre a mesma fracção foram posteriormente celebrados entre B, C e D, negando apenas procedência ao pedido de declaração de nulidade da escritura pública de hipoteca outorgada entre D e E. Porém, alterando a decisão da matéria de facto do TJB, veio o TSI a revogar as declaradas nulidades e absolver B, C e D dos pedidos de A contra os mesmos deduzidos, pois que considerou, em face desta alteração, inverificados os pressupostos legais da alegada simulação. Invocando o acórdão recorrido do TSI, o Colectivo assinalou que, o que resulta da compra e venda entre A e B, da compra e venda entre B e C e da subsequente hipoteca feita por C sobre o imóvel é que A, B e C sempre contraíram empréstimos e constituíram hipotecas sobre o imóvel em causa de valor superior ao das compras e vendas, o que indicia que usavam o imóvel para se financiarem e obterem empréstimos dando o imóvel em garantia, o que não permite concluir pelo acordo simulatório. Face ao disposto no art.º 388.º do Código Civil, mal andou o Tribunal a quo ao aceitar a prova testemunhal para se convencer dos factos de onde emerge a simulação entre A e B, uma vez que a norma proíbe a prova testemunhal quando se trate de convenções contrárias ao teor de documentos autênticos e particulares. No que diz respeito à declaração de expresso reconhecimento por B de uma compra fictícia da fracção X a A, exactamente a confissão da matéria de facto, de acordo com os elementos dos autos, o documento foi produzido em 31 de Março de 2010, enquanto a sua caligrafia só foi reconhecida em 26 de Junho de 2019, a poucos dias da apresentação da petição inicial, evidente é que o documento em que a declaração se encontra materializada não pode constituir um princípio ou começo de prova para, com o seu recurso e em seu complemento, se poder valorar a prova testemunhal produzida, e, desta forma, se chegar à solução a que chegou o TJB quanto à sua decisão da matéria de facto, pelo que, é correcta a alteração pelo TSI da matéria de facto dada assente no TJB. Destarte, correctamente afastados os factos em que assentava a decisão de direito que deu como verificados os necessários pressupostos e requisitos legais de uma simulação efectivamente ocorrida, motivos não há para se confirmarem as declaradas nulidades relativamente às compras e vendas celebradas.

Face ao exposto, em conferência, acordaram no Colectivo em negar provimento ao recurso, mantendo-se o acórdão recorrido do TSI.

Cfr. Acórdão do Tribunal de Última Instância no Processo n.º 129/2024.